Tudo começa
em um ponto. Os meios precisam ter início e fim; e o fim, início, meio e fim.
Quando é o fim de um fim? Da mesma forma que é o começo de um começo. Abro a janela
e vejo através dela outro igual a mim, com os olhos ultrapassando as vidraças.
Nossos olhos buscam o infinito que chega devagar, às vezes feio e, em outras
ocasiões, bonito. Mas não é um bonito que encanta, é um “bom nito” que alegra
os olhos.
Enquanto
dura o tempo da beleza, ficamos imóveis, até que passe o tempo do encanto para
dar lugar ao costume. As belezas seriam inesperadas se não carregássemos
conosco o verbo acostumar. Acostumamos, pois, não acreditamos nas surpresas de
uma mesma coisa e uma mesma coisa pode ser nova todos os dias, basta mudar o
jeito de olhá-la. Devagar ou apressadas, não importa. A demora de uma
contemplação gasta a santidade de um santo.
Meus ouvidos
e olhos me encheram de pedras. Separei-as para que o santo que há em mim não as
atire em outros e fira alguém olhando pela janela porque penso: não se deve
olhar pela janela. E fira também alguém que não passou pela porta no momento em
que eu quis. Vivo entre o tempo de dois quereres, o que eu quero em mim e o que
almejo nos outros. Esse último é sempre mais forte.
Ontem eu
procurei por mim. Estava ocupado qualificando as pedras. Ao meu redor havia
muitos olhando pela janela e outros muitos desejando as portas.
Acordei numa aldeia. O sol sorria lá
do alto, e no arraial as pessoas caminhavam apaixonadas por seus costumes.
Alguns amavam a aldeia e se exaltavam nela. Outros defendiam as estradas. Há o
amor que ama e há o amor que diz amar. Ninguém se confiava, porque não amavam o
amor. Nos tempos de muita fé, descubro um pouco de Narciso em mim. Sou como os
outros. Sou a virtude da vaidade. Quanto ao lado que se começa um ponto, deixo
por decidir. Alguém já disse: de qualquer lado você pode estar certo, mesmo
estando certo do lado errado.